O leite que está na mesa do café da manhã vem da caixinha, leões e rinocerontes são animais nativos e não há plantas que curem uma picada de formiga. Esses são pensamentos que, muito provavelmente, perpassam na mente de muitas das nossas crianças, e não há razão alguma para culpá-las. É o que diz uma pesquisa britânica, revelando que 64% das crianças brincam fora de casa apenas uma vez por semana, ou que 28% não fizeram uma viagem para o campo no último ano, 21% nunca estiveram em uma fazenda, ou ainda, que 20% nunca subiram em uma árvore. Com uma infância como essa, tais pensamentos não são nada absurdos.
O recente estudo, realizados com crianças de 8 à 12 anos, acompanha o resultado de outros muitos similares: muitas crianças conseguem identificar mais facilmente um Dalek (robozinho da série britânica Dr. Who) do que uma coruja; a grande maioria brinca mais em espaços fechados que abertos. A distância percorrida sozinha até em casa vem diminuindo drasticamente ao longo dos anos; 43% dos adultos acreditam que as crianças não deviam brincar fora de casa sem a presença de um adulto antes dos 14 anos. E ainda assim, ironicamente, são relatados mais casos de crianças hospitalizadas por caírem da cama do que de árvores.
E tudo isso significa algo? Numa era de TV à cabo, vídeo games, facebook e smartphones, é realmente preciso sujar as mãos na terra e colher frutas no pé? Bem, obviamente, não há mal nenhum em aprender um pouco sobre a natureza e tudo aquilo que está além das telas e da soleira da porta. E se, como resultado disso, você desenvolver uma conexão com a natureza, você pode agregar novas experiências para o seu bem viver, o que é por si só algo bom.
Mas um conjunto de evidências tem mostrado que a questão não é tanto o que as crianças sabem sobre a natureza, mas o que acontece com elas quando estão na natureza (e não só estão, mas estão por conta própria, sem a presença de adultos). Cientistas, doutores(as), especialistas em saúde mental, educadores(as), sociólogos(as) vem sugerindo que quando as crianças deixam de brincar na natureza, isso pode afetar não só seu desenvolvimento individual, mas a sociedade como um todo.
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O escritor norte-americano Richard Louv, autor do livro Last Child in the Woods, definiu o fenômeno em algo como “desordem do déficit de natureza”. Algo “muito profundo” tem acontecido na relação das crianças com a natureza nas últimas décadas, diz ele, por razões múltiplas. A tecnologia, “obviamente”, é uma delas: uma matéria recente da Kaiser Family Foundation nos EUA, descobriu que jovens de 8 à 18 anos, passam em média 53h por semana nas mídias de entretenimento.
Também há o fato de que, nos dias de hoje, o tempo das crianças é muito mais pressionado, para cumprir uma escala de tarefas. O tempo livre deve ser usado de maneira “produtiva”, com atividades extra-curriculares, cursos preparatórios, esportes organizados – não há mais tempo para o pega-pega na rua com os vizinhos.
Mas o grande obstáculo que impede as crianças de estarem do lado de fora é a insegurança causada por uma sociedade violenta. O medo de rapto ou mal causado por pessoas estranha, é o principal motivo pelo qual os pais não permitem que seus filhos brinquem fora de casa sem supervisão. A cobertura massiva da mídia, de tão poucos casos desse tipo ocorridos, contribui para alimentar tal medo; de fato há um risco, mas ele é mínimo – as chances de uma criança ser morta por um estranho na Grã-Bretanha são literalmente uma em um milhão”.*
É um problema no qual precisamos nos voltar, porque as consequências de falharmos em deixar nossas crianças brincarem de maneira independente ao ar livre estão começando a fazerem elas próprias falharem. No site Children & Nature, Louv cita uma longa lista de estudos científicos indicando que o tempo gasto em brincadeiras na natureza tem um impacto fundamental na saúde das crianças. A obesidade talvez seja o sintoma mais visível dessa falta de vivência. Os estudos também apontam que a regularidade de brincadeiras feitas ao ar livre produzem melhoras significativas em crianças diagnosticadas como hiperativas, com déficit de atenção, entre outros transtornos psicológicos. Além disso, contribuem para o processo de aprendizagem, criatividade e de bem estar emocional.
Apenas 5 minutos de “brincadeiras verdes” podem produzir um rápido acréscimo de bem-estar e auto estima, com grandes benefícios para os jovens, de acordo com um estudo desse ano da Universidade de Essex.
Brincar livremente na natureza, aumenta a capacidade de resolução de problemas e auto-discplina. Socialmente falando, contribui para o trabalho em equipe, flexibilidade e atenção. Emocionalmente, reduz a personalidade agressiva e aumenta a felicidade. “Crianças serão mais espertas, mais sociáveis, saudáveis e felizes quando tiverem mais oportunidades de brincar livremente, sem supervisão”, conclui um estudo de autoridade da Associação Americana de Medicina, em 2005.
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“A natureza é uma ferramenta”, diz outro estudioso, “que permite às crianças acesso não só ao mundo externo, mas também o interno”. Então escalar uma árvore, diz ele, “significa aprender a correr riscos por conta própria, e crucialmente, aprender a medir tais riscos. Cair da árvore é uma bela lição sobre riscos e recompensas.”
Pergunte à qualquer um com mais de 40 anos para recontar as memórias mais preciosas de sua infâncias, e poucas serão dentro de casa; menos ainda envolveram a presença de um adulto. Brincar livremente, sem as limitações impostas por um adulto é o que nos lembraremos de melhor. Da maneira como vão as coisas, as crianças serão incapazes de guardar memórias preciosas como estas: 21% das crianças brincam regularmente de maneira livre hoje em dia, comparado à 71% na época de seus pais.
No entanto, a situação não está de toda perdida. Nos EUA, a “desordem do déficit de natureza” é algo novo: Louv está ganhando espaço com seu discurso na Academia Americana de Pediatria. Os governantes locais estão se reunindo com profissionais da saúde para prescreverem mais tempo na natureza para crianças com problemas. Na Grã-Bretanha, algumas organizações também estão fomentando uma cultura que leve as famílias para fora de casa, mesmo que a princípio estas experiências ainda estejam sendo mediadas por adultos.
Chove muito aqui… Faz frio… Anoitece ás 4 da tarde no inverno… Não é fácil deixar as crianças na rua com temperaturas quase negativas ou negativas… O verão é curtinho… aqui na Irlanda do Norte ás vezes dura apenas duas semanas… Eu bem queria levar a minha filha mais á rua, mas não é fácil… os parques infantis estão molhados, as florestas são lindas, mas no frio não são apetecíveis… Quero contornar isso, mas quando a minha filha fica gelada ao fim de cinco minutos, eu quero é ir para casa e acender a lareira para ficar no quentinho… Tenho tanta dó das crianças daqui… da minha filha… 🙁 Uma amiga disse que deveria pôr as botas da chuva e casacos e sair na mesma, mas ela fica doente… as crianças ficam doentes… São poucos os pais corajosos, que saem de qualquer jeito, com bom ou mau tempo…
Ambiente romântico, hein Marlene….talvez seja difícil viver uma vida inteira assim, mas viva cada dia como se fosse o primeiro… Grande abraço!!!