Há uma variedade de produtos nas prateleiras de supermercados e muitos praticamente prontos, bastando apenas um aquecimento no micro-ondas ou o movimento de abrir um pacotinho. Até as sementes agora são “administradas” por grandes corporações e, portanto, nossas frutas, verduras e legumes são cada vez menos orgânicos e genuínos no sabor.
Delegamos nossa alimentação ao desconhecido e sentimos os resultados dessa decisão não apenas na saúde do corpo, mas também na energia da alma, nas emoções, na falta de disposição e de conexão com o meio ambiente.
Perdemos parte do interesse em cozinhar. Anulamos de nossas vidas uma grande parcela da habilidade manual do misturar, sovar, cortar, experimentar um pedaço de algo cru, perceber aromas, texturas e cores. A forma de consumo atual criou um cenário no mínimo interessante: não cozinhamos, mas torcemos pelo cozinheiro ao assistir um programa de TV, uma competição. Salivamos perante o prato exposto na tela. Achamos “bonita” a horta na cozinha, o contato da cozinheira com as frutas da época! Buscamos receitas, mas no fim, não saímos do sofá ou do pré-pronto.
Criamos o hábito do fácil em quase tudo! O fácil é também a corrente que nos escraviza. O pronto mina nosso poder de decisão, de participação.
Só consumir alimentos prontos não nos oferece a mesma experiência que o manipular de alimentos concede. Quando preparamos nossas refeições exercitamos nosso potencial criativo e permitimos que nosso movimento natural de promover transformação aconteça. Aqui, me refiro a transformações positivas!
É natural em cada ser a habilidade da alquimia, do transformar algo bruto em algo bom de verdade e mais ajustado a uma necessidade. Ocorre, que com as demandas externas e formas mais “fáceis” de padronizar o cotidiano, perdemos esse entendimento. Perdemos nosso lado alquímico natural e culinário. Perdemos a diversão contida nisso e não aproveitamos o espaço de aprendizado que temos na cozinha de casa.
Nos movemos para aquilo que é embalado e dura mais tempo. Posteriormente, criamos uma rotina de busca pela saúde para suprir os problemas causados pela degustação do alimento que nem sabemos o que é, o que contém, mas que permitimos ingressar em nossas vidas.
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O sistema que nos alimenta
Numa pesquisa mais profunda é fácil compreender o quanto o sistema alimentício que temos é devastador em seus processos.
Há um grande impacto no meio ambiente causado por esse sistema que gera a exaustão de recursos naturais como água, por exemplo. O mesmo sistema que semeia a poluição dos solos. Dentro desse giro, existe ainda os maus tratos aos animais que parte do costume de trata-los como alimento e produto, como vimos nas últimas cenas portuárias da baixada santista. Outros pontos: a gama de tóxicos levados à atmosfera em tantos processos industriais. Não podemos esquecer a quantidade de embalagens plásticas nos oceanos. Na verdade, no quesito embalagens, há tantos materiais nocivos utilizados que poderíamos deixar um texto só para isso!
O lixo gerado também é um ponto de interrogação em nossa sociedade. O que fazer com ele?
Dentro de toda essa engrenagem, lembremos também relações de trabalho escravizadas que existem e que não podem ser ignoradas perante o olhar daquele que busca entendimento sincero do sistema atual e nada saboroso que preenche nossos carrinhos de compras e hábitos.
Fica evidente que o sistema alimentício que temos não favorece a saúde. Nem do ponto de vista físico, nem do ponto de vista ambiental, emocional ou social. É um sistema que desgasta e maltrata, mas que pode ser transformado.
A dependência do sistema
Inegável que estamos dependentes do sistema alimentício que temos. E a pergunta é sempre: Como sair disso?
Primeiro, pensando que ser independente desse sistema é mais que economia no aspecto financeiro, é também um deixar de contribuir com a insustentabilidade que temos no planeta. Além disso, é necessária uma mudança radical na nossa relação com os alimentos, na forma que temos de perceber a “comida” e os motivadores de nosso apetite. É necessário autoconhecimento de fato!
O como nos alimentamos hoje, pode definir como será o planeta, nossa saúde e nossa alimentação no futuro não tão distante.
Vale ressaltar que a compreensão da alimentação além do simples ato de comer algo é necessária. Há uma ciência nos processos, há emoções e histórias, há culturas imersas na trajetória alimentar de todos nós e que geram uma forma, um padrão. Chegamos no ponto em que o padrão precisa ser repensado e mudado. Precisamos desenraizar manias para semear ajustes e cooperação.
Melhorar a qualidade de vida implica em destravar os cadeados de um sistema que nos deixa confortáveis. Excessivamente confortáveis. O conforto nos dá a ideia de que há simplicidade e que está indo tudo muito bem. No entanto, quando o conteúdo dos pratos tem uma história nociva por trás, não estamos de fato cooperando. Nem conosco e menos ainda com o mundo. Não há uma energia sustentável circulando e menos ainda, saudável.
Essa dependência do que já está quase pronto e o consumo de determinados tipos de alimentos no tira a verdade orgânica da vida que é a de ciclos perfeitos, saudáveis e equilibrados. Ficamos alienados da nossa própria presença no mundo. Parece que vagamos sem responsabilidade, com desinteresse mas em desespero pela mudança.
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Práticas para sair do ponto cego e insustentável
- O simples não é de menor qualidade. O simples é aquilo que flui e alimenta sem peso. O simples dá disposição.
- Abundância não é comprar muito. Abundância é comprar o essencial com inteligência e respeitando o meio.
- Desperdício é sinal de pouco ou nenhum entendimento acerca de ações e seus impactos, inclusive sociais. Senso de medida é senso de respeito.
- Compartilhar alimentos é manter viva a habilidade de cooperar. Pratique o cozinhar em grupo ou se for uma culinária em solitude, não esqueça de compartilhar fatias de doçura no trabalho (um bom bolo …).
- Cozinhar garante certa autonomia e independência do sistema brutal que vivenciamos. Garante saúde também. Você sabe o que está consumindo e consome comida de verdade!
- Plante e plante. Ainda que more em apartamento, plante. Temperos, ervas aromáticas e até feijões. Mesmo que este te renda duas ou três vagens! Resgate sua conexão com a terra. Saboreie os sabores que você produziu e pegue gosto nisso.
- Aprecie comida de verdade. Desapegue de marcas, da ideia do mais caro e melhor, das embalagens excessivas.
- Mude hábitos e padrões que já reconhece como nocivos. Não se prenda ao que o outro vá pensar. Faça algo para além do paladar. O conteúdo do prato mostra parte do seu conteúdo e capacidade interna. Não prolongue aquilo que sente não fazer bem a si, ao outro e ao mundo.
- Frequente cursos de culinária, de agricultura, veja documentários, leia rótulos, pesquise e se interesse pelo que digere com uma atenção especial que é diferente de paranoia.
- Tenha experiências de retiros em locais afastados e note como as cozinhas destes locais funcionam. A grande maioria compartilha apenas de alimentação não violenta (sem carnes), possuem hortas e todo um critério especial para cozinhar, incluindo meditação nas hortas e na hora do preparo dos alimentos. Alimento é vibração e nestes locais, a cozinha é bem sagrada.
Estar num sistema sem ser esmagado por ele é possível, desde que a alma desperte para o fato de que quem gira o sistema é o consumo. Consumidores criam a necessidade de consumo e não o contrário. Consumidores mantém empresas e financiam práticas. Se o consumo muda, se a dependência minimiza e até se anula (com doses de esperança agora) é sinal que mudamos e se mudamos, ah … o mundo muda sim!
A alimentação mais saudável é muito importante para uma via melhor, parabéns pelas dicas.