Conheça as Especiarias Selvagens do Brasil
Dias atrás, estávamos temperando um bolo e conversando como coisinhas tão pequenas, como cravos e grãos de pimenta podem ter movido o mundo.
A busca, conquista e comercialização de temperos foi o ponto principal de grandes momentos da História, como as Grandes Navegações, que resultaram na invasão do Brasil. Também foi o pontapé inicial da globalização.
História das Especiarias
Na Idade Média elas não eram populares e a comida “sofria” com seus sabores, apenas o sal e algumas ervas eram usadas na preparação dos alimentos. A partir do século 15, com a expansão marítima e as novas rotas comerciais com o Oriente, as especiarias começaram a fazer parte da vida europeia.
Pimenta do reino, cravo, canela, noz-moscada e gengibre eram as especiarias mais conhecidas e revolucionaram a culinária do velho continente, posteriormente outras ervas como açafrão, cardamomo, anis, chás da China e ervas aromáticas também entraram no cotidiano europeu. Enriqueceram muitos comerciantes e reinos, ampliaram e mudaram completamente o, até então, chato, cardápio do ocidente.
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O primeiro uso da terra do Brasil pelos portugueses foi para a aclimatação da cana-de-açúcar, então tida como uma especiaria por sua raridade e alto valor de mercado. A cana brasileira foi soberana no mundo até meados do século 17. Acredita?
Provavelmente a denominação ” especiarias” surgiu a partir do século 12, quando os italianos dominavam o comércio com o Oriente no Mar Mediterrâneo, as cidades italianas como Florença, Gênova, Veneza entre outras, comercializavam os temperos muito antes das grandes navegações portuguesas e espanholas.
O termo era utilizado para designar os produtos asiáticos caros e difíceis de serem obtidos. Ao mesmo tempo em que era feita a aclimatação das espécies asiáticas no Brasil, as nativas eram descobertas, a começar pelas pimentas, uma grande variedade delas.
Especiarias Selvagens do Brasil
Uma das maiores riquezas do Brasil colonial eram as especiarias. Se exportavam tanto as especiarias asiáticas aclimatadas aqui, como as nativas e esse comércio representava o forte da economia da época.
Entre elas estão cravo-do-maranhão, canela-de-sassafras, canela-cravo ou louro-canela (Aniba canelilla) – considerada pelo botânico alemão Carl Friedrich Phillip von Martius como a mais nobre das lauráceas brasileiras, conhecida hoje no Pará como casca ou folha preciosa e muito utilizada para banhos e chás.
Ainda na lista estão canela-cravo da Amazônia, cravo-da-terra, originário da Mata Atlântica “irmão” do cravo-da-índia -, pimenta-rosa, que é a semente da aroeira, descoberta pela nouvelle cuisine francesa. O urucum é tido como o açafrão brasileiro, sem falar nas baunilhas da Mata Atlântica, que foram praticamente exterminadas e hoje só são encontradas em matas fechada.
O processo de migração para as cidades e a urbanização, aliados à industrialização da comida, tendo como base a cultura da praticidade americana, fez com que o consumo das especiarias e condimentos se tornasse bastante tímido, fazendo desaparecer muitas das espécies da cena brasileira. No entanto, acreditamos que, neste momento em que a gastronomia busca sutilezas e que a fitoterapia se volta a tratamentos naturais com respaldo, elas podem voltar às nossas vidas.
Mais de 70% das nossas especiarias estão na Amazônia. Tanto que na região, seu uso é ainda muito freqüente. No Pará, Amazonas e Maranhão ainda se usa muito o cipó-alho, as pimentas, uma espécie de chicória chamada coentro de caboclo, lembrando também do cumaru, a nossa baunilha brasileira que é bem melhor que a baunilha tradicional, pois tem praticamente o dobro de cumarina, a proteína que dá sabor à baunilha. O Cumaru é hoje a especiaria mais utilizada na alta gastronomia francesa.
Vamos a lista de algumas das nossas especiarias tupiniquins
Inúmeras especiarias estão num lugar que o brasileiro desinformado chama de “mato” e esse “mato! enche nossa cozinha de cor, sabor, aroma e vitaminas da melhor qualidade.
Essa lista e uma apanhado do que eu vi, ouvi e li sobre as especiarias do Brasil.
Canela Sassafrás
- Nome Científico: Ocotea odorifera
- Origem: Mata Atlântica
- Tem sabor de canela com retro gosto de louro.
- Como usar: Da pra usar a casca, caules, folhas, galhos, raízes, frutas e flores, para uma gama de pratos. Esta árvore é rica em nutrientes impressionantes. Aqui usamos o pó das folhas secas em diversos pratos e sobremesas.
Puxuri (Noz Moscada Brasileira)
- Nome Científico: Licaria puchury-major
- Origem: Região Amazônica
- Lembra o cardamomo e a noz-moscada, mas com sabor mais mentolado.
- Como usar: Possui um sabor único e aroma espetacular, harmoniza bem em doces ou salgados e possui um aroma levemente defumado, proporcionado um sabor incrível quando empregado em receitas como substituto da noz moscada.
- Receita de Eggnog com puxuri. Vai muito bem no doce de leite também.
Cravo da Terra/Mato
- Nome Científico: Calyptranthes aromatica
- Origem: Mata Atlântica
- O gosto é de cravo.
- As flores e botões florais podem ser utilizados como substituto do cravo-da-índia em inúmeras receitas.
- É uma ótima planta para cultivar dentro de casa, pois não exige muita luz.
Imbiriba ou Embiriba/Iquiriba
- Nome Científico: Xylopia frutescens
- Origem: Cerrado, Nordeste e Norte
- Muito aromática, suavemente picante, tem um gosto de canela no fundo.
- Como usar: triturada, substituindo a canela.
- Use nas receitas em que usaria canela.
Atenção* Não confunda a Xylopia frutescens com a pimenta-de-macaco (Xylopia aromatica), árvore da família das Anonáceas. Macacos e pássaros comem a parte que envolve a semente para auxiliar a digestão. A pimenta-de-macaco tem um sabor entre a noz moscada e a pimenta do reino, a semelhança e cheiro lembram mais a pimenta do reino, na verdade. A vantagem de usar a nossa “pimenta” [e que ela não irrita o intestino, pelo contrário, auxilia no processo digestivo.
Cumaru (Baunilha Brasileira)
- Nome Científico: Dipteryx odorata
- Origem: Região Amazônica
- Tem sabor adocicado, com notas de coco e baunilha.
- Como usar: Ela cai super bem em sobremesas, principalmente nas feitas com leite e também fica ótima combinada com outras especiarias. Uma única fava pode aromatizar cerca de 2 litros de leite ou cremes na produção de sobremesas: o seu poder de aromatização corresponde ao de 3 favas de baunilha.
- Receita de brigadeiro de cumaru
Amburana
- Nome Científico: Amburana cearensis
- Origem: Caatinga e Cerrado
- Lembra uma mistura de canela com baunilha, tem cheiro acentuado, peculiar, agradável e um gosto único, levemente adocicado.
- Como usar: ralada em pratos, bolos e sobremesas, em infusão com ervas ou leite, em drinks, para fazer xarope e tintura.
- Receita de Pudim com amburana
Fava de Aridan
- Nome Científico: Tetrepleura
- Origem: África, naturalizada brasileira
- Tem notas de banana-passa e aroma levemente defumado. Seu sabor lembra baunilha e caramelo.
- Como usar: Em infusão de leite, chá e xaropes para drinks.
- Receita de Creme Brulé com Aridan e esse drink divino da Neli.
Pacová ( Cardamomo Brasileiro)
- Nome Científico: Renealmia exaltata
- Origem: Mata Atlântica
- Aromática, lembra gengibre e cardamomo.
- Como usar: triturada ou em infusão
- O cardamomo é o antídoto do café na Ayurveda, podemos usar o Pacová da mesma forma, algumas sementinhas na hora de passar o café. Fica muito bom no gim ( já experimentei) e também para fazer biscoitos substituindo o cardamomo.
Priprioca
- Nome Científico: Cyperus articulatus
- Origem: Amazônia.
- Raiz muito perfumada com notas de terra, fumaça e notas aromáticas oscilando entre ervas e madeira.
- Como usar: ralada ou em infusão.
- Pudim de leite com Priprioca .Vai bem no arroz-doce também.
Considerações
É difícil uma receita exata com especiarias, o melhor é conectar com elas e deixar nossa intuição nos guiar.
Tenha responsabilidade ao comprar, compre de extrativistas que respeitem a natureza.
A maioria dessas plantas correm risco de extinção. A canela sassafrás, por exemplo foi explorada ao extremo pelo óleo safrol, de grande importância para as indústrias química, alimentícia e farmacêutica.
Aqui em Santa Catarina, centenas de milhares de árvores foram abatidas, picadas e transformadas em óleo num processo a vapor, entre os anos de 1940 e 1980, nas famosas fábricas de óleo de sassafrás. A maioria da produção era exportada, inclusive para a NASA, por ser um óleo que só congela a temperaturas menores que 18 graus centígrados negativos.
Grávidas, lactantes e pessoas com doenças crônicas devem evitar o uso pois não existem estudos científicos suficientes sobre as especiarias brasileiras.
Pesquise mais sobre a lista de especiarias, elas tem muitos nomes populares.
É possível encontrar as especiarias selvagens na internet e em grupo de trocas do facebook, como o de Pancs. Também no site do Empório Poitara, aqui.
A fontes foram inúmeras. Entre em contato para perguntas especificas.